sábado, 20 de março de 2010

Retorno

Encontrei esses dias uma transcrição da coluna que o Luiz Paulo Faccioli fez do meu livro, "O Ideograma Impronunciável", na Band News e que me deixou muito contente.

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           O processo de formação de um escritor dura uma vida inteira. Não há escritor que já nasça pronto e tampouco aquele que não tenha nada a crescer depois do último livro. A literatura é um eterno processo de aprendizado. Quanto mais se vive, e quanto mais se aprende, mais chance há de se viver e de se aprender. Mas existe também um aspecto bastante subjetivo e que parece contrariar a possibilidade de superação pela aprendizagem: há os que nascem com o talento para escrever, e há os que, mesmo querendo e tentando uma vida inteira, jamais chegarão lá. Será obra da genética, da água que se bebe, de uma determinada configuração astral na hora do nascimento? Talvez um dia a ciência venha a explicar o fenômeno. Mas há, posso garantir que há, o dom para escrever, e que poucos têm.

           Quem gosta de ler está sempre à procura desses espécimes raros e, quando um aparece, é sempre um alento: a literatura continua a salvo.

           João Kowacs Castro tem duas décadas de vida e lançou pela Dublinense seu primeiro livro de contos, O ideograma impronunciável. Segundo o autor, o livro foi escrito aos dezenove anos.

           Tudo nele impressiona: o domínio do conto, talvez o mais difícil dos gêneros em prosa, a naturalidade do discurso, as belas e originais figuras de linguagem, o despudor de usar um léxico forte, às vezes chulo, mas sempre condizente com o universo ficcional, o timing preciso, o atrevimento de inserir poesia em meio à prosa — o último conto, inclusive, é todo ele escrito em versos. Não há uma linha temática, mas temas recorrentes, como anjos e alturas, que propiciam uma certa unidade.

Algumas passagens surpreendem pela construção sofisticada:

PASSOS NAS MINHAS PEGADAS! OLHOS NAS MINHAS COSTAS! Não tenho descanso.


Está bem atrás de mim. Entro em um prédio, dou de cara com uma escada. Meus pés se desfazem na velocidade da subida. Tudo para trás e para baixo, para trás e para baixo, e eu subo, uma rolha em direção aos milhões de fogos de artifício. Meu sangue minhas pernas meus pulmões. Sorrio canino, a língua de fora, o coiote repousando na beira do penhasco. Estou no topo de um prédio, tenho talvez minutos.

O ideograma impronunciável é obra de gente grande.


............................( http://www.artistasgauchos.com.br/portal/?cid=346 )